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Enfim foi asfaltada a ladeira da Alameda dos Flamboyants no Jardim Sol Nascente; trecho da rua com mais casas segue sem pavimentação, com muitos buracos e sem iluminação pública

Um trecho de 200 metros da Alameda dos Flamboyants no Jardim Sol Nascente, na Terra Preta, desde março vinha passando por obras de drenagem e pavimentação. O contrato foi assinado pela prefeitura de Mairiporã e a empresa AC Melko Engenharia e Construções LTDA em fevereiro deste ano no valor de R$ 209.391,34. De acordo com o Google Maps, em toda a sua extensão, a rua tem quase 700 metros, desde a “entrada” do bairro (seu início) até fechar o arco e encontrar a Alameda das Cerejeiras (término).

Cume da ladeira, onde termina o asfalto e segue o trecho de terra;

Quem transitou pelo local na última semana percebeu que a ladeira, problema de longa-data dos moradores, enfim foi asfaltada, ainda que não conte com a devida sinalização de trânsito.

Morador rebocando carro atolado na ladeira em agosto de 2016;

Morador da Flamboyants há 26 anos e dono de um espaço destinado à reciclagem, José Carlos Oliveira (57) afirma que, em sua avaliação, o “asfalto é de terceira” e que “daqui um ou dois meses estará danificado de novo”. “Bom mesmo seria se os caras conseguissem puxar o asfalto para cá e fazer a canalização da água que desce daqui [do escadão]”, sugere.

Ladeira asfaltada;

Alguns motoristas ouvidos pela reportagem reclamaram da espessura do asfalto, que seria muito fino e já estaria “se esfarelando”, com algumas pedras soltas.

A área agora asfaltada contempla ao menos quatro empresas e outros cinco imóveis residenciais, enquanto o trecho que segue sem pavimentação e com muitos buracos tem mais de 25 residências e concentra mais de 200 moradores. Não há nenhuma empresa instalada na parte de cima da rua. 

Trecho com mais de 25 residências segue com rua de terra, muitos buracos e sem calçada;

“Somos moradores há muitos anos, as empresas vieram agora. As empresas têm mais atenção do que nós aqui? Estamos largados aqui no fundo”, lamenta José.

De fato a obra contratada, que compreendia apenas a drenagem e pavimentação dos 200 metros até o cume da ladeira, está em vias de ser concluída, mas o que preocupa os moradores que vivem no trecho de terra e sem calçada é a falta de posicionamento da prefeitura quanto à continuidade do asfalto até o final da rua.

Percorrido pelo trecho que segue na terra, com muitos buracos e sem calçada;

Há rumores por parte da vizinhança de que a administração atual, que se organiza para dar ampla publicidade em suas redes à inauguração da obra, irá concretar os outros 300 metros restantes. “Um vereador veio aqui e falou que dali para cá seria concreto, mas não tem definição se será este ano, ano que vem ou daqui 10 anos e isso preocupa porque estamos aqui na terra”, expõe o morador.

Procurada, a atual administração não se posicionou a respeito.

Preteridas

Das cinco alamedas que cortam o Jardim Sol Nascente, a do Flamboyants e a Manacas são as únicas sem asfalto em toda a sua extensão. As alamedas das Cerejeiras, Cambarás, Jacarandás e estão, no mínimo, a coisa de dois anos à frente em relação à pavimentação das vias.

O contrato de afastamento da Alameda das Cerejeiras foi celebrado em maio de 2017. Naquele mesmo ano a prefeitura deu início à contratação também para a do Cambaras e a Jacarandá foi completamente asfaltada no ano passado.

Sem luz

Além da estrada de terra, a Alameda dos Flamboyants tem postes sem as hastes para as luminárias, todos instalados no final da rua, próximos ao conhecido “escadão”, uma trilha que há algum tempo conta com degraus construídos pelos próprios moradores e único caminho para o ponto de ônibus escolar, além de ser a principal entrada e saída de pedestres do bairro. Por se tratar de uma iniciativa dos próprios moradores, o “escadão” tem degraus irregulares, sem padronização, e não é acessível. 

Postes sem hastes para as luminárias na altura dos números 25 e 27 da Flamboyants;

Basta dar 18h (ou antes disso em dias mais frios) para que o breu tome conta de toda uma área de mais de 100 metros de distância. Segundo relatos de moradores, a falta de iluminação é uma realidade que supera, e muito, uma década. “Os postes foram colocados, mas nunca vieram colocar a lâmpada e aqui passam muitas crianças. Como que uma mulher vai passar à noite aqui?”, questiona ainda o conhecido Zé.

"Escadão" visto de baixo: principal entrada e saída de pedestres do bairro;

Posicionamento


Todas as solicitações de posicionamento junto à prefeitura foram enviadas ao endereço de e-mail da secretaria municipal de Obras e Serviços, que, na tarde de terça-feira 4/8, respondeu não apresentando a posição da pasta a respeito da matéria, mas indicando que a reportagem precisava encaminhar a demanda ao endereço da assessoria de imprensa da administração, o que foi feito na noite do mesmo dia.

Até o envio da nota pode-se afirmar que, procurada, a prefeitura não se posicionou em relação à obra de drenagem e pavimentação que não compreende toda a extensão da Flamboyants, mas beneficia ao menos 4 empresas, enquanto mais de 25 residências na parte de cima seguem sem calçada e com a rua de terra.

Também foi solicitada a confirmação ou não a respeito do que os moradores têm falado sobre a rede de águas pluviais do trecho asfaltado ter sido construída até o "pé da ladeira", o que impediria o prosseguimento do asfalto na parte de cima porque, sem quebrar a rua, não seria possível realizar a emenda da galeria.

A prefeitura também não respondeu sobre os postes de energia elétrica sem as hastes de iluminação pública, ambos próximos ao "escadão", assim como não se posicionou sobre a falta de degraus regulares e acessibilidade no local.

Empresa municipal de ônibus informa que deixará de atender a população a partir de 25/8

Desde o dia 24/7 circula nas redes sociais um informe da Empresa de Transportes Mairiporã - ETM comunicando que deixará de prestar o serviço de transporte coletivo na cidade a partir da 0h do próximo dia 25 de agosto, quando encerra o contrato de 10 anos entre a prefeitura e a empresa (assinado em 24/08/2010). A princípio seriam afetadas apenas as linhas municipais, enquanto seguirão sem alterações as intermunicipais (Terminal Tietê, Parada Inglesa, Franco da Rocha e Pedra Branca).

Informe à população distribuído pela ETM;

Às pressas, no último dia 4/7, a prefeitura divulgou em sua Imprensa Oficial a intenção de contratação de uma empresa em caráter emergencial para o período de 180 dias (6 meses). O prazo para a formalização das propostas encerrou-se no dia 13 e até a publicação deste artigo não houve o anúncio do vencedor, que, de acordo com as regras anunciadas, terá de garantir o menor valor de tarifa, limitado aos atuais R$ 4,70.

Extrato da Imprensa Ofiicial da prefeitura com os critérios do contrato emergencial;

Ainda desconhecida, a nova empresa também terá de oferecer a partir do dia 25/8:
  • veículos com idade máxima de 5 anos, contados da data de fabricação;
  • 100% da frota acessível, com elevador;
  • ao menos 70% da frota deverá ter ar-condicionado;
  • todos os veículos deverão ter tomadas USB, câmeras internas, bilhetagem eletrônica e sistema de monitoramento com aplicativo para os usuários.
Até junho a prefeitura vinha trabalhando num processo de concorrência pública para a contratação de outra empresa. A previsão era de que no dia 15/6 fossem abertos os envelopes com as propostas. No entanto, por algumas inconsistências, o trâmite foi paralisado pelo Tribunal de Contas do Estado de São Paulo - TCE-SP.

Durante todos os dias da semana, o serviço de transporte coletivo municipal atende cerca de 11 mil passageiros em 22 linhas que interligam o município. 

Apagão?

Apesar de restar menos de 30 dias para o vencimento do contrato, a prefeitura, em nota oficial, afirma que a partir do dia 25 "implantará um novo Sistema de Transporte Público Municipal, em substituição ao sistema atualmente operado pela Empresa de Transporte Mairiporã – ETM", o que não causaria maiores transtornos aos usuários, como, por exemplo, um apagão no transporte coletivo da cidade.

Nota oficial da prefeitura;
Funcionários

O encerramento do contrato implicará na demissão de ao menos 70 motoristas e cobradores da ETM, segundo funcionários da própria empresa, uma vez que não há qualquer previsão de os empregados serem absorvidos pelo vencedor do contrato emergencial.

Nova empresa

No dia 29/7, por volta das 17h, este articulista recebeu de uma fonte a informação de que a empresa "Eduardo Medeiros Transportes LTDA", de CNPJ 03664969000155, foi a escolhida para prestar o serviço de transporte coletivo municipal a partir do próximo dia 25/8.

No mesmo dia entrei em contato, por e-mail, com o proprietário da empresa solicitando a confirmação se teria vencido a licitação e, desde que apresentando os documentos, passaria a ser a responsável pelo transporte coletivo na cidade. Também pedir que falasse mais sobre sua empresa e apresentasse alguma outra área atendida, para fins de atualizar este texto.

No dia seguinte Eduardo Medeiros respondeu convidando para conhecer "nosso escritório em São Bernardo do Campo, onde funciona nossa holding", apesar de o endereço que consta do registro da empresa ser o da Travessa dos Itaubas, 4, no Jabaquara, zona Sul da cidade de São Paulo. Também compartilhou um número de telefone que seria de sua secretária, pelo qual tentamos conversar com a própria, sendo frustradas as três tentativas realizadas no dia 30*.

Na Imprensa Oficial do município deste sábado 1/8, a prefeitura divulgou que a empresa não foi a vencedora da licitação, mas, sim, escolhida sem concorrência. Assinada pelo secretário municipal de Segurança Pública, Transporte e Mobilidade Urbana, Daniel Augusto Ramos Ignácio, a dispensa de licitação não informa o valor de contrato.

Extrato da Imprensa Oficial do município;
Na Imprensa Oficial também não há qualquer menção aos critérios considerados na escolha da empresa e se a população já contará a partir do dia 25/8 ou se haverá algum tipo de transição para o novo "Sistema de Transporte Público Municipal".

*Por Whatsapp, conseguimos contatar a secretária, que nos respondeu nesta segunda-feira 3/8.

Atualizado em 1/8, às 11:22, para inclusão do bloco "Nova Empresa".

Atualizado em 3/8, às 11:13, para inclusão do asterisco.
O fato aconteceu na última terça-feira (21),em uma chácara que possui um vasto terreno entre os bairros da Vila Constancia e Botujuru, na cidade de Campo Limpo Paulista. As queimadas para “limpeza” do mato é um problema constante na região. Com a capinagem realizada nos últimos dias, o dono do imóvel optou por atear fogo na vegetação por volta das 16h.
O incêndio teve uma rápida propagação por conta do vento forte e vegetação extremamente  seca- Victor Ricardo

Com o clima seco e os ventos característicos do outono, o fogo logo se alastrou facilmente pelo campo e, em poucos minutos, tomou proporções incontroláveis, colocando em risco, inclusive, três casas vizinhas próximas à Avenida Casa Branca. Além das chamas fortes, uma grande quantidade de fumaça tomou conta da região.
O fogo também atingiu uma área de mata fechada próxima à propriedade. O local já passou por um reflorestamento por se tratar de uma margem em torno de uma afluente do Rio Jundiaí. Gradativamente, o local tornou-se refugio de macacos e tucanos na região, e agora teve parte do seu ecossistema prejudicado pela atitude do proprietário.
A chacará possui acesso por uma rua de terra na altura do nº138 da Av. Casa Branca e outro acesso próximo ao número 69 da Rua Andradina. Duas vezes por ano realiza incêndios para limpar a vegetação presente no local.
Mais um incêndio que aconteceu recentemente na Estrada Faustino Bizetto, o pior da situação é que o aparelho que distribuí às redes telefônicas quase foi atingido- Victor Ricardo

Em tempos de Covid-19, a fumaça causada pela “limpeza” colocou em risco o sistema respiratório dos moradores que possuem algum tipo de problema pulmonar. Atualmente os gestores públicos da região de Jundiaí tenta conscientizar de todas as maneiras possíveis para que a pratica de incêndios propositais seja abolida do cotidiano dos munícipes.
Consultada sobre o ocorrido a Prefeitura Municipal de Campo Limpo Paulista,  orientou que os munícipes denunciem as queimadas pelo setor de ouvidoria que pode acessado no link http://www.campolimpopaulista.sp.gov.br/ouvidoria/ouvidoria-campo-limpo-paulista.php ou ligue no 199 para acionar a Defesa Cívil, que tem funcionado como órgão de inspeção e de triagem para o Corpo de Bombeiros de Jundiaí.


Ressaltando que os incêndios propositais são proibidos conforme a Lei Estadual N° 10.547 de 2000.


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Cava subaquática armazena milhões de metros cúbicos de sedimentos majoritariamente poluídos retirados na dragagem de canal em Cubatão; empreendimento pertence à empresa que tem entre seus acionistas a mineradora Vale e é objeto de críticas por parte de especialistas ambientais e moradores da Baixada Santista    


Cubatão e Santos. Cidades do litoral sul paulista que juntas servem de residência para mais de 500 mil pessoas. A pouco mais de 65 quilômetros do Marco Zero de São Paulo, capital do Estado, na divisa entre esses municípios, um buraco de 400 metros de diâmetro – maior do que o estádio do Maracanã – e 25 metros de profundidade aberto há menos de cinco anos está no centro de uma discussão em que as principais personagens são os moradores locais, muitos deles ribeirinhos e pescadores artesanais, especialistas ambientais e sociais da Baixada Santista e as empresas VLI Multimodal S.A, prestadora de serviços no setor de logística, e Usinas Siderúrgicas de Minas Gerais – Usiminas, uma das maiores companhias siderúrgicas do País.
Visão das margens do Rio Casqueiro na altura da Vila dos Pescadores, em Cubatão; foto: Júlia Sanchez
Ali, em pleno Estuário de Santos – nas águas quietas e doces do Rio Casqueiro, próxima ao manguezal da Ilha Piaçaguera –, a Confined Aquatic DisposalCAD, Dispositivo de Confinamento Aquático, em tradução livre, nome técnico dado ao buraco também conhecido por cava subaquática, ocupa uma área de cerca de 180 mil metros quadrados e já armazena mais de 2,6 milhões de metros cúbicos de sedimentos majoritariamente poluídos retirados no processo de dragagem de navegação do Canal Piaçaguera, principal rota de acesso de navios de carga ao Terminal Integrador Portuário Luiz Antônio Mesquita – TIPLAM, porto administrado pela VLI, fundada em 2010 no formato de holding controlada por quatro acionistas, entre eles a mineradora Vale.

Cidade mais poluída do mundo

O sedimento despejado na cava remonta à segunda metade do século XX, quando Cubatão foi escolhida para a instalação de um polo industrial.

No início da década de 1980, com descontrole ambiental ao ponto de condenar à morte crianças por conta da poluição do ar, provocada pelas grandes empresas do parque, a cidade foi reconhecida pela Organização das Nações Unidas – ONU como a mais poluída do mundo. Havia elevados índices de poluentes no ar, solo e água.

Empresas instaladas no Polo Industrial aproveitavam-se dos rios da região para destinar os efluentes líquidos provenientes da produção, como os rejeitos jogados no Canal Piaçaguera pela então Companhia Siderúrgica Paulista – COSIPA, hoje Usiminas, no processo de fabricação de aço. Atualmente as empresas dizem contar com sistemas de controle e destinação para os poluentes. Procurada pela equipe de Reta Final para colaborar com a reportagem, a Usiminas não respondeu o contato. 
Detalhamento do projeto de dragagem do Canal Piaçaguera e local de instalação da cava; imagem: reprodução / vídeo institucional da VLI
A prática insustentável contribuiu para a formação de uma lama poluída com alta concentração de metais pesados e dos denominados Hidrocarbonetos Aromáticos Políciclicos – HAPs no leito do Canal. Os HAPs são poluentes oriundos da queima insuficiente de substâncias orgânicas – em geral, combustíveis – e agentes que podem causar diversos tipos de câncer quando do contato com a pele humana ou, como seria o caso, ingerido por meio do consumo de pescados daquela área.

Com o leito poluído, a dragagem do Canal, quando há o desassoreamento do corpo d’água, demanda técnicas mais sofisticadas e tecnologias capazes de remover o passivo ambiental deixado pelas empresas ainda no período em que as atividades industriais não eram suscetíveis aos sistemas de controle de poluentes.

“Enorme passivo ambiental” ou “melhor solução”?

A escolha da VLI pela instalação da cava subaquática não teria acompanhado tal preocupação. Ao menos é o que afirma Élio Lopes dos Santos, químico, engenheiro industrial e autor de pareceres técnicos sobre a dragagem e o buraco instalado no Piaçaguera.

“Há o abstrato e o concreto. No abstrato, todos são favoráveis ao meio ambiente, todos defendem. Já no concreto querem fazer isso que estão fazendo na cava, ou seja, se beneficiar de uma tecnologia ultrapassada, que não é sustentável, porque deixa um enorme passivo ambiental à atual e futura gerações, por ter feito lá um buraco para enterrar os sedimentos e depois cobrir”, disse o engenheiro, que foi gerente da agência da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo – CETESB em Cubatão por 25 anos, em alusão à fase do projeto da cava em que a lama contaminada será “tampada” com sedimentos limpos.

Infográfico do processo de dragagem, por sucção, do Canal Piaçaguera; arte: Mônica Sobral para o jornal A Tribuna
Para a Silvia Sartor, bióloga com mestrado e doutorado em oceanografia pela USP, a decisão da VLI pela instalação da cava apoia-se no aspecto econômico do projeto. “A empresa está gastando muito menos do que qualquer alternativa”, comenta.

Gerente geral de portos da VLI, Alessandro Gama diz que a cava foi a melhor solução encontrada pela empresa, “considerando as características do sedimento: o volume, a forma como ele foi disposto e o tipo de draga”.

Ainda de acordo com o porta-voz, a VLI quer “limpar o Canal”. “No momento em que retiramos todo esse sedimento e fazemos a limpeza do Canal a CAD atende o seu fim de confinamento, ou seja, deixa-se de ter uma condição de material espalhado e passa a ter uma condição confinada mais controlada e muito menor”, explica, lembrando que “a dragagem será feita apenas uma única vez, porque o objetivo da cava é receber os sedimentos que estão com contaminação”.

De uma retificação, como é definido o conjunto de alterações de um curso d’água, realizada na década de 1960 nos rios Mogi e Piaçaguera criou-se o Canal de mesmo nome deste último. Com 60 metros de largura e 10 metros de profundidade, a via aquática foi aberta para atender aos interesses comerciais da COSIPA.  

No início dos anos 2000, ainda como COSIPA, a atual Usiminas entrou com pedido junto à CETESB para aumentar o nível de dragagem do Piaçaguera e, com isso, receber embarcações com calado maiores em seu terminal portuário. Em contrapartida, apresentou algumas alternativas para a destinação dos materiais contaminados do Canal, sendo uma delas o uso do chamado Dique do Furadinho, espaço em terra localizado dentro das dependências da empresa, para realizar no local o devido tratamento dos sedimentos. O Dique se enquadra na exigência imposta entre os anos de 2004 e 2005 em reuniões do Conselho Estadual de Meio Ambiente – Consema de que os resíduos deveriam ser alocados em uma área já degradada para evitar um novo dano ambiental.

Em 2005, o órgão ambiental expediu uma licença prévia válida por cinco anos para a empresa realizar a dragagem de até 12,5 metros de profundidade – considerada medida original do leito. Passados 11 anos, em 2016, a CETESB, com base na licença prévia vencida, aceitou o pedido da Usiminas para a abertura da cava, que foi idealizada e instalada por outra empresa, a VLI.  Em resposta a questões levantadas pelo deputado estadual Paulo Côrrea Júnior (PATRIOTA), a Companhia afirma que “não há caducidade da Licença Prévia quando iniciada a implementação das ações cuja viabilidade ambiental (aprovação da concepção) é atestada pela Licença Prévia”.

A equipe de Reta Final contatou a CETESB por e-mail, enviando-lhes seis perguntas sobre o processo de licenciamento e atuação do órgão no monitoramento da cava. Em resposta, a CETESB enviou uma nota que pode ser lida, na íntegra, mais abaixo.

Ao mesmo tempo, a VLI entrou com pedido junto ao IBAMA para aumentar a dragagem de 12 para 15 metros de fundura. Para Élio, a CETESB ter permitido o empreendimento à Usiminas e a cava ter sido aberta pela VLI é apenas um dentre os diversos vícios do licenciamento. “Tem uma questão aí no meio também que envolve – eu nunca vi isso na história da CETESB – a questão da titularidade, ou seja, um tira a licença e o outro é que faz”, expõe Lopes, que explica ainda por que o Dique do Furadinho não foi usado, conforme sugerido pelo Estudo e Relatório de Impacto Ambiental – EIA RIMA aprovado em 2005.
Arte gráfica apresenta as delimitações da cava subaquática instalada no Estuário de Santos; imagem: reprodução de vídeo institucional da VLI
“A Usiminas pretende ampliar e transformar aquilo lá em pátio de contêiner e, se usasse aquilo lá, seria um espaço físico a menos para desfrutar na implantação do tal pátio. Está muito bem clara essa manobra”, comenta em referência à informação divulgada pela imprensa local de que a Usiminas estaria trabalhando para expandir o seu porto.

Ao descrever o que é e como se dá o funcionamento da CAD, Alessandro Gama afirma que a cava está devidamente autorizada e o espaço onde está instalada foi, sim, considerado no processo de licenciamento. “A área onde foi construída a cava foi escolhida por ser a mais abrigada, o que significa que sofre pouca ação de corrente e tem estabilidade maior em relação às demais do Canal Piaçaguera”, disse, lembrando que a distância entre o empreendimento o Canal também foi levado em consideração. “Estar próxima do Canal é uma condição da CAD para que a movimentação entre o sedimento removido do Canal e a disposição tenha a menor distância possível, para não se ter o risco de dispersão durante a dragagem”.

Para o diretor da Associação de Combate aos Poluentes – ACPO, Jeffer Castelo Branco, a VLI deveria ter optado pelas alternativas. “Há próximo da cava várias áreas de terra seca onde se pode destinar o material de forma ambientalmente correta e em seguida tratar os sedimentos para que possam ser reutilizados”, expõe.

“Não é a cava aprovada”

A técnica de se abrir uma cava subaquática para despejo de sedimentos tóxicos ou não-tóxicos é muito usual nos EUA. A United States Environmental Protection Agency – US EPA, agência ambiental norte-americana, regula a abertura dos buracos em dois modelos de cavas: confinada, quando o espaço é revestido por uma camada de concreto e, em alguns casos, conta com uma barreira de alvenaria, como uma espécie de barragem; e a denominada de contida, quando se aproveita uma depressão do terreno marinho para a destinação dos resíduos. A EPA ainda monitora a quantidade de sedimentos alocados nos espaços.

No porto de New Bedford Harbor, localizado no estado de Massachusetts, por exemplo, os proprietários já instalaram duas cavas e estão escavando uma terceira. As duas em funcionamento são de confinamento e armazenam juntas 250 mil jardas cúbicas de sedimentos contaminados, o que corresponde a cerca de 230 mil metros cúbicos. A terceira cava, quando aberta, receberá a mesma quantidade. Os números representam dez vezes menos do que a capacidade do buraco aberto pela VLI no Largo do Casqueiro.

Jeffer Castelo Branco diz que o EIA RIMA da obra prevê que o modelo de cava aprovado pelo Consema para o Largo do Casqueiro é a confinada, em que há o isolamento completo de todo o seu conteúdo com o meio externo, e não contida como é a instalada pela empresa de logística. “A cava contida é totalmente diferente daquela que foi aprovada pelo Consema e jamais deveria receber a taxa elevada de resíduos em sedimentos como aconteceu. Então ela totalmente irregular e depõe contra o meio ambiente e a saúde pública”, afirma Castelo Branco.

A ACPO foi fundada em 1994 e lançou ano passado uma petição contra a cava. “Um primeiro esforço” no sentido de conscientizar a opinião pública, define Jeffer. Clique aqui para ler o documento.

Apesar de mencionar em mais de uma oportunidade o termo “confinado”, Alessandro Gama em nenhum momento fala que o ambiente da cava é revestido. Ao explicar a estrutura, Gama diz que a “CAD nada mais é que um aprofundamento em um ponto específico na margem do Canal, com 25 metros no centro e com uma geometria cônica, tendo em sua parte inferior um diâmetro de cerca de 300 metros e na parte superior, 400 metros”.

O porta-voz diz que o formato cônico daria mais estabilidade, particularmente no período em que esteve vazia. "Já não existe tanto risco de alguma lateral ceder agora que a cava está praticamente preenchida com os sedimentos”, afirma.

Vila dos Pescadores

A mais de dois quilômetros da cava, na Vila dos Pescadores – entrada da Baixada Santista para quem chega pela rodovia Anchieta –, aproximadamente 200 homens e mulheres que vivem exclusivamente da pesca tiveram suas atividades alteradas desde a abertura do buraco. José Arnaldo dos Santos, de apelido Vadinho, preside a associação comunitária do bairro em que cerca de 70% das pessoas residem em casas de palafitas, às margens do Rio Casqueiro, e afirma não ter sido convidado para participar do processo de instalação e operação do projeto da VLI. “O início do processo foi feito às caladas, à noite, no escuro, sem que ninguém soubesse”, conta Vadinho, demonstrando preocupação com a estrutura. “Se ali tiver algum veneno que venha gerar uma doença mais para frente, vamos ser o primeiro a sofrer as consequências”.


Vídeo produzido pela Frente Sindical Classista da Baixada Santista em parceria com o Instituto Sócio Ambiental e Cultural Vila dos Pescadores

Para o eletricista Osvaldo Pereira da Silva, também morador da Vila, os pescadores da região foram prejudicados com a instalação da cava subaquática. “Ninguém quer comprar os peixes, porque falam: ‘é peixe da Vila dos Pescadores? Isso está poluído”, comenta Da Silva.

Há relatos de pescadores que antes pescavam praticamente no “quintal de casa”, no Rio Casqueiro, e que atualmente seguem para Bertioga, a 30 km de distância, e Itanhaém, a cerca de 50 km da Vila dos Pescadores.

O porta-voz da VLI Alessandro Gama discorda da versão dos moradores de que teriam sido atingidos com a abertura da cava. Segundo Gama, “o material dragado estava no fundo do Canal Piaçaguera há décadas, então se havia algum risco para a população próxima ali, ele existiu durante o período em que o material esteve exposto”.

A VLI, ainda segundo Gama, justifica que utilizou um tipo de dragagem por sucção, com o objetivo de inibir o risco de dispersão ao remover os resíduos do Canal, e que o processo envolveu, sim, as comunidades de pescadores, desde que “formalmente associadas”.  Alessandro cita como exemplo as capatazias, que, de acordo com o responsável pelos portos da empresa, durante todos os anos do projeto participaram de reuniões com os coordenadores da obra. “Foram apresentados os resultados dos estudos, como seria o processo de dragagem e, da mesma forma, demos todas as condições para que as capatazias acompanhassem os trabalhos e se certificassem de que estávamos fazendo conforme planejamos”, finaliza. 

Ligada à causa da cava, a bióloga Silvia Sartor observa que os moradores da Vila dos Pescadores foram pegos de “surpresa”. “Foi uma conduta muito errada, porque nas normas para o licenciamento há a exigência de que se converse com a comunidade. Não houve a intenção, a seriedade nesse sentido”, afirma.

O que fazer agora?

A VLI assegura que os resíduos da cava estão em processo de decantação para, em seguida, serem cobertos com uma manta de sedimentos limpos, conforme consta do projeto inicial. A empresa garante ainda que não precisará abrir novas cavas para os materiais que ainda sairão na dragagem do Canal Piaçaguera.

Para Sartor, a retirada dos sedimentos da cava é o melhor a se fazer agora. “Acredito que até uma tubulação por baixo, para retirar de forma segura e levar para um espaço em terra seria possível”, sugere.

Com a cava aberta e em funcionamento, Élio lopes também recomenda a retirada dos sedimentos do buraco. “O certo seria eles prepararem uma célula e uma bacia de decantação em terra, bombear o material e tratar o líquido”, comenta.

Jeffer Castelo Branco diz que “se deve, imediatamente, apresentar um projeto de remoção e tratamento, pois seria uma covardia nós, da presente geração, estarmos estocando resíduos perigosos para os nossos filhos e netos”.

Presidente da associação comunitária da Vila dos Pescadores, Vadinho não se mostra muito favorável à ideia dos últimos três especialistas e afirma que “já que foi feito, tem ficar onde está. Mexer mais uma vez é veneno em dobro para a gente”.

Rádio.Doc: seu podcast de boas histórias

O caldo denso de posições divergentes sempre rende uma boa história. Em sua estreia, o Rádio.Doc, podcast de boas histórias do projeto Jovens Cronistas, levanta questões e alimenta a discussão sobre a cava subaquática de Cubatão: um buraco maior do que o estádio do Maracanã e com 25 metros de profundidade aberto para armazenar sedimentos poluídos retirados na dragagem do Canal Piaçaguera.

Ouça e compartilhe. Boa audição.



Com a palavra, CETESB

Em nota, "a CETESB esclarece que o processo de licenciamento da Cava seguiu a legislação vigente e a operação no local ocorre desde meados de 2017, sem registro de incidentes, com previsão de término para o segundo semestre deste ano".

Segundo a companhia, " a titular da Licença Ambiental é a USIMINAS e não há impedimentos legais para tratativas com terceiros. Cabe à empresa responsável pela operação encaminhar à CETESB relatórios quinzenais sobre a operação de dragagem e disposição do material dragado".

Ainda no texto enviado à reportagem, a CETESB diz que "para a aprovação da abertura foram realizadas simulações que demonstraram a estabilidade e considerados mais de 10 mil ensaios físicos, químicos e biológicos (antes, durante e após a disposição do material dragado na cava), os quais não demonstraram quaisquer alterações no ecossistema".

Em uma posição que soa como entusiasta do projeto, o órgão afirma que,"no caso de Cubatão, houve ainda uma medida de segurança adicional, que foi a instalação de uma cortina de silte em todo seu perímetro (490 metros). Ao atingir o limite para depósito do material dragado, o local será coberto com areia e haverá a recomposição natural da área".

Este texto foi atualizado pela última vez em 03/06/2019, às 16:11.

Produzido por Reta Final, grupo acadêmico integrado por:
Adriano Garcia – Jornalista 
Claudio Porto – Jornalista (texto)
Gervásio Henrique – Jornalista (reportagem de campo)
Júlia Sanchez – Jornalista (reportagem de campo)
Renan Salles – Jornalista (reportagem de campo)
Valter Silva – Jornalista (reportagem de campo)
Victor Ricardo – Jornalista
A discussão em torno do Polo Petroquímico de Capuava, em Mauá, na Grande SP, envolve atores que se desconhecem; moradores e pesquisadores não recebem apoio das empresas, que criaram comitê para intermediação que ninguém sabe, ninguém viu

De um lado, poluição do ar, do solo e dos rios próximos. Do outro, desenvolvimento econômico regional, com reflexo direto na geração de emprego. No meio, moradores encurralados em uma área densamente urbanizada e à mercê de doenças, como, por exemplo, o hipertireoidismo. Esta é a situação posta nos limites entre as cidades de São Paulo, capital do estado de São Paulo, Mauá e Santo André, municípios da conhecida Grande SP, onde está instalado desde 1972 o Polo Petroquímico de Capuava, primeiro complexo de empresas do ramo de derivados de petróleo do Brasil.

Ainda que em 1954 a Petrobrás, petrolífera estatal fundada em 1953, tenha instalado uma refinaria no Parque Capuava, bairro de Mauá onde fica parte do Polo e que dá seu nome, a ideia de estabelecer naquela região um espaço para reunir empresas da cadeia produtiva do setor petroquímico só foi colocada em prática no início dos anos 1970. Atualmente o Polo conta com 14 companhias que, juntas, atendem aos diversos segmentos de mercado a partir do fornecimento de subsídios para a produção no ramo de plásticos e borrachas, passando pelo de tintas e vernizes, ao de higiene e limpeza.
Setor em que há a queima de gases; foto: Valter Silva
Em levantamento divulgado no ano de 2014 pela consultoria MaxiQuim, a indústria química brasileira obteve faturamento líquido de 361,7 bilhões de reais em 2013. Do total, 13,7% correspondia às atividades da indústria do ramo no ABC, região da qual faz parte o Polo, que, sozinho, ainda segundo o estudo, faturou 8,6 bilhões de reais em 2014, sendo 2,2 bilhões de reais destinados ao Valor Adicional Fiscal – VAF, índice contábil que mede a participação dos municípios no repasse de tributos como o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS e o Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI, de cidades como Mauá. O relatório ainda dava conta da existência de 10 mil empregos diretos e indiretamente vinculados ao Polo. 

O número de 14 empresas instaladas no complexo retrata as características da indústria petroquímica e a divisão de sua cadeia produtiva em produtos petroquímicos básicos, produtos intermediários e produtos finais petroquímicos. A finalidade é uma só: produzir matérias-primas para a indústria de transformação. Um exemplo é a família “Poli” – polipropileno, polietileno, poliestireno –, usada em copos descartáveis, placas de isopor, entre outras manufaturas.

Usado na limpeza de alguns tipos de vidros e componentes eletrônicos, o Álcool Isopropílico foi o primeiro produto fabricado a partir de conceitos da petroquímica, em meados dos anos 1920, em uma refinaria norte-americana. Desde então, o funcionamento da petroquímica e seus danos ao meio ambiente e à saúde humana demanda certo conhecimento técnico, o que, ainda hoje, se estende apenas aos seus colaboradores internos, sem alcançar a população vizinha de complexos como o de Capuava.

Tireoidite Crônica Autoimune

Maria Angela Zaccarelli Marino, doutora em Endocrinologia pela Universidade de São Paulo – USP e professora da Faculdade de Medicina do ABC, ao longo dos últimos 30 anos se debruça sobre exames clínicos e laboratoriais de moradores próximos ao Polo Petroquímico de Capuava. Tudo começou quando, em 1989, atendeu em seu consultório, em Santo André, um homem morador da região diagnosticado com Tireoide de Hashimoto, problema causado pelas chamadas células plasmáticas que produzem anticorpos capazes de danificar a glândula da tireoide. 

O distúrbio, que leva ao hipertireoidismo, doença que pode apresentar sintomas graves como o retardo no crescimento biológico e de aprendizagem, à época era raro em homens e crianças, o que levantou a curiosidade de Marino. Em 2004, portanto 15 anos depois, a médica endocrinologista deu por encerrado parte de um estudo que ao final envolveu 6.306 pacientes, divididos em dois grupos, de modo que o um, com 3.356 pacientes, era constituído exclusivamente por residentes do entorno do Polo (vizinhos) e o outro, de 2.950 pacientes, tivesse apenas de pessoas que moravam cerca de 9 km de distância da primeira região e sem indústrias petroquímicas (vizinhos distantes).

Os resultados de tal investigação foram divulgados em 2012 no Journal of Clinical Immunology, renomada publicação do meio científico. No artigo, a doutora afirma que 905 pacientes do grupo de vizinhos (26,9%) foram diagnosticados com Tireoidite Crônica Autoimune, enquanto no grupo de vizinhos distantes apenas 173 pessoas (5,1%) tiveram diagnósticos positivos.  “O Hipertireoidismo Primário é a doença mais prevalente da tireoide, está aumentando muito nos últimos anos e a poluição do ar poderia ser uma de suas causas, já que encontramos entre os moradores próximos ao Polo Petroquímico de Capuava um número elevado de casos, o que aumenta o risco de doenças na própria tireoide”, comenta a especialista, lembrando que o seu estudo foi confirmado pelo Centro de Vigilância Epidemiológica da secretaria de Saúde do Estado que, em 2012, seguindo a mesma metodologia de grupos usada por Marino, também encontrou diferença considerável no número de casos da doença em vizinhos do Polo e moradores mais afastados.
Entrada principal da Brasken, no Polo Petroquímico de Capuava; foto: Valter Silva
Em um ranking de doenças causadas pela poluição do ar nos arredores do Polo, é verdade que o hipertireoidismo ocuparia o primeiro lugar com o status de ser a mais grave, muito por causa de seus sintomas quase imperceptíveis, mas está longe de ser a única. Rosa Alves Tamborim, vizinha das indústrias do Polo há cerca de oito anos, diz que tem alergia ao pó preto expelido pelas empresas e passa constantemente por problemas respiratórios, isso, sem receber qualquer acompanhamento dos profissionais de saúde pública da região e dos representantes das corporações.  “Nunca vieram aqui saber como estamos nos sentindo”, disse à equipe de Reta Final, que conversou ainda com Adriano Augusto Tamborim, filho de Rosa, bartender e cozinheiro. O jovem afirmou que “nunca ouviu falar” do Comitê de Fomento Industrial do Polo do Grande ABC – COFIP ABC, entidade criada em 2015 por iniciativa das empresas para realizar a intermediação entre o complexo petroquímico e os moradores.

Comitê para “intermediação” = falta de apoio

O COFIP-ABC instalou em 2017 o que chama de Conselho Comunitário Consultivo – CCC, com “o objetivo de fortalecer esse relacionamento, proporcionando mais autonomia à comunidade e melhorando a comunicação sobre questões relacionadas à saúde, segurança e meio ambiente”, escreve em seu site oficial. O CCC, por sua vez, seria “formado por representantes da comunidade do entorno do Polo”, diz o site.

Em tese, desde a criação do COFIP-ABC, o organismo seria o responsável pelos simulados de evacuação da área em cenários, por exemplo, de vazamento de gás. A reportagem entrou em contato com o COFIP-ABC, para entender melhor o funcionamento da iniciativa e questionar por que todos os moradores entrevistados por Reta Final desconhecem o projeto, mas não obteve resposta antes de o fechamento do texto.

A ausência de intermediação e apoio, financeiro e instrutivo, por parte das empresas não é sentida apenas pelos moradores. A pesquisa da doutora Maria Angela também não contou com as indústrias. “Recebi somente o apoio do promotor de justiça do Meio Ambiente de Santo André, Dr. José Luiz Saikali, e do Ministério Público do Estado. Nunca perguntaram a respeito dos trabalhos realizados por nós”, reforça.  O MP-SP abriu um inquérito civil para investigar se as empresas estão descumprindo normas ambientais.
Entrada e saída de caminhões de transporte da Brasken, no Parque Capuava; foto: Valter Silva
A atuação das empresas – ou falta dela – vai de encontro ao que sugere Priscila Bolcchi, engenheira ambiental e consultora da Infocus Ambiental. A engenheira diz que “se as empresas abrirem mais suas atividades para a comunidade e investir em tecnologia, acompanhado de uma política ou programa estadual para redução dos poluentes emitidos” seria um bom início para que se mantenha, convivendo juntos, o Polo, com seus interesses, os moradores, sem que tenham suas vidas atingidas, e o meio ambiente da região, evitando-se os danos.

Na contramão dos resultados dos estudos, Antônio Lucas, morador do Parque Capuava há mais de 45 anos e dono de um bar na região, garante nunca ter sentido qualquer mal estar decorrente da exposição à poluição do ar. Ainda assim, o Polo o deixa desassossegado. “Às vezes acontecem alguma séria aí [no Polo], mas eles abafam”, comenta, citando como exemplos explosões, vazamentos de gás e problemas com uma das caldeiras.

Numa rotina em que é item obrigatório varrer o ambiente diariamente e lavá-lo ao menos duas vezes por semana, Lucas reclama da poeira preta e denuncia que a petroquímica Brasken, antiga Petroquímica União S/A, aproveita a madrugada para emitir seus poluentes na atmosfera. “Em períodos de chuva eles soltam muita fumaça no ar e, à noite e na madrugada, aproveitam do horário para soltar pelas chaminés os resíduos que não são úteis”, conclui.

Na mesma linha, Neide do Carmo e Silva, dona de casa e vizinha de frente do Polo há 40 anos, diz que não é muito frequente as vezes em que sente os efeitos de morar próximo a uma petroquímica. “Antigamente tinha um cheiro ruim. Ao longo dos anos melhorou bastante”, reconhece Silva.

“Devidos sistemas de controle de poluentes instalados”

Segundo Bolcchi, engenheira ambiental, o que poderia explicar o aperfeiçoamento das técnicas por parte das empresas nos últimos anos é a exigência para que suas atividades estejam devidamente licenciadas pelo órgão ambiental fiscalizador, a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo – CETESB. “Durante o processo de licenciamento ambiental é verificado todos os tipos de impacto ambiental que a atividade pode causar e solicitado ao empreendedor que tome as medidas necessárias para atender aos limites estabelecidos na legislação”, descreve.

“Não são as empresas que definem se irão ou não utilizar um Equipamento de Controle de Poluição – ECP. A CETESB irá cobrar a melhor tecnologia aplicável e verificará por meio de medições a eficiência do equipamento”, reforça Bolcchi, dizendo ainda que a instalação de filtros nas chaminés e flares, como sugerido por moradores da região, pode sim limitar o fluxo de emissão de poluentes, mas não o impede. “Ter limites de emissão não significa emissão zero”, avalia a engenheira.

Flare aceso; foto: Valter Silva
Em agosto do ano passado a então presidência da Câmara Municipal protocolou um ofício em que solicitava à CETESB informações sobre a política de controle da poluição nos bairros da região do Polo. Três meses depois, em novembro, o órgão respondeu que todas as empresas do complexo se encontram devidamente licenciadas e que “possuem os devidos sistemas de controle de poluentes instalados”. Ainda no documento, a companhia lembra que os seus agentes realizaram ao menos 13 inspeções técnicas nas dependências das empresas nos últimos seis meses, efetuando apenas uma autuação.

A poluição proveniente de polos petroquímicos não se restringe apenas a do ar. Além da emissão de efluente gasoso, que é a poluição do ar, há ainda o lançamento do efluente líquido, a poluição hídrica, e a contaminação do solo, quando de derramamento ou infiltração de produtos químicos.

“Penso que para qualquer situação, seja um polo petroquímico ou não, sempre é necessário verificar qual a melhor tecnologia disponível”, finaliza Bolcchi.

“A saúde é um bem inquestionável. Sendo assim, poderia haver entendimento mútuo, entre saúde e indústria”, comenta a doutora Maria Angela, que diz ainda não ser “contra o desenvolvimento industrial, desde com atenção às questões de saúde. Acredito ser muito mais econômico ser ético e atender ao básico direito do cidadão à saúde”.

Com a palavra

A equipe de Reta Final entrou em contato com as secretarias municipais de Saúde de São Paulo e Mauá, e de Meio Ambiente da prefeitura de Mauá, solicitando posicionamento das respectivas pastas quanto à aparente falta de iniciativas específicas para o atendimento dos moradores vizinhos do Polo Petroquímico de Capuava. Não houve resposta até o fechamento desta reportagem.


Produzido por Reta Final, grupo acadêmico integrado por:
Adriano Garcia – Jornalista (reportagem de campo)
Claudio Porto – Jornalista (texto)
Gervásio Henrique – Jornalista
Júlia Sanchez – Jornalista
Renan Salles – Jornalista
Valter Silva – Jornalista (reportagem de campo e fotos)
Victor Ricardo – Jornalista
Fotos e objetos ajudam a conhecer o passado da cidade de Mairiporã, na Grande SP

Olarias, ruas e avenidas, personalidades locais e os tradicionais casarões. Juntos, dão vida ao Memorial de Mairiporã, instalado nas dependências da Biblioteca Municipal da cidade. Ali, com alguns poucos metros quadrados, painéis temáticos com fotografias e instalações com tijolos e cerâmicas e objetos históricos, como, por exemplo, o conjunto de sofá e poltronas doado pela Câmara dos Vereadores e patrimônio número um do município, dividem espaço com os cerca de 30 mil títulos literários do acervo da biblioteca.
Foto: Montagem a partir de fotos enviadas por Bethos Massucato
Com o objetivo de retratar Mairiporã desde os tempos em que era apenas Vila de Juqueri (1696-1948), em um túnel do tempo com mais de quatro séculos de história, o Memorial foi fundado em junho de 2017 e trata-se do primeiro espaço com artigos que ajudam a conhecer passado da cidade, que em Março deste ano completou 130 anos de sua emancipação.

Para Bethos Massucato Pires, curador do Memorial e coordenador da Biblioteca Municipal,  o espaço tem a nobre missão de contar a história da cidade e, com isso, tem ido ao encontro de uma das muitas curiosidades humanas: a de conhecer tanto o seu passado quanto o do lugar onde mora. “O dia inteiro tem movimento de jovens, idosos, filhos levando os pais, estudantes em excursão escolar, moradores em geral, como os das olarias que se identificam com as instalações, e esse resgate histórico é interessante porque parece que as pessoas sentem falta desse nacionalismo territorial, do passado, as pessoas têm sede do passado”, descreve Massucato.
Foto: Montagem a partir de fotos tiradas por Bethos Massucato
Sem número exato de peças expostas, o acervo do Memorial conta ainda com um cavalete de filmagem do ator e cineasta brasileiro Amácio Mazzaropi, que em 1955 gravou na cidade o filme “A Carrocinha”. Telhas produzidas por escravos negros e móveis doados por famílias tradicionais da cidade são outros itens expostos numa linha cronológica iniciada há muito tempo, ainda com os índios Guarus da tribo indígena Guaianases, passando por Inês Monteiro Alvarenga, conhecida por “matrona” da então Vila Juqueri, às décadas já republicanas.

Natasha Morgan, historiadora e moradora de Mairiporã, afirma que o Memorial é um projeto importante por oferecer à população local a oportunidade de conhecer a história da cidade. “O município não tem patrimônio histórico. Todos os prédios importantes que, de alguma forma, contaram a história não receberam a preocupação do poder público para o tombamento e preservação. A maioria dos patrimônios da cidade foi derrubada”, lembra Morgan.

Nota do editor

No dia 27 de março, data de aniversário da cidade, a Prefeitura de Mairiporã divulgou o que parecer a primeira e única edição da chamada “Mairiporã em Revista”, com o que seriam as realizações da atual gestão do prefeito Antônio Aiacyda a pouco menos de dois de anos de encerrar seu terceiro mandato. A iniciativa do Memorial de História de Mairiporã não recebeu uma linha sequer das 52 páginas da publicação, disponível aqui.

A revista diz, em sua capa, que o seu conteúdo é apenas a título de “prestação de contas” – com as devidas ressalvas: há ruas não pavimentadas constando no documento como se já tivessem passado por obras. Bom, já que é para prestar contas, não compreendo por que a iniciativa do Memorial não consta das páginas da tal revista, quando o espaço, ainda que sem os devidos recursos – a coluna Mais SP solicitou ao portal da transparência informações quanto à existência ou não de orçamento específico para o projeto, mas não obteve resposta até a publicação deste texto –, nasceu em 2017, ou seja, na atual administração, e, decerto, foi um dos poucos de seus acertos até aqui.

O espaço da coluna Mais SP está aberto para qualquer posicionamento da prefeitura.

Memorial de Mairiporã

Com entrada franca e aberto ao público de segunda à sexta-feira, das 8h às 17h, o Memorial fica na Biblioteca Municipal, localizada à Rua Antônio Morelato, 225, no Centro da cidade.


Atividade reúne grupo da sociedade civil, corpo de bombeiros e funcionários de parque estadual
Foto: Reprodução / Facebook
O último dia 22 de março marcou o Dia Mundial da Água. Em Mairiporã, cidade da Grande SP, a data foi lembrada com o já tradicional mega mutirão de limpeza na represa Paulo de Paiva Castro, reservatório responsável pelo abastecimento de mais de seis milhões de paulistas e localizado nos limites entre a cidade e o município vizinho de Franco da Rocha. A atividade aconteceu durante toda a sexta-feira e reuniu cerca de 80 pessoas, numa realização conjunta entre a equipe de canoagem stand up paddle Piratas Mairiporã, Sabesp e funcionários do Parque Estadual do Juquery.

De acordo com os organizadores, há a expectativa de que o mutirão deste ano tenha ultrapassado as seis toneladas de resíduos sólidos descartados de forma irregular retiradas ao longo das margens e sobre as águas da represa em 2018.
Foto: Reprodução / Facebook
Apesar de realizada desde 2014 ao menos duas por ano, a mobilização ainda conta com pouco apoio dos moradores e autoridades da cidade. “Infelizmente não vemos a população de Mairiporã conosco, participando do mutirão com os Piratas”, lamenta Victor Coelho, 32, diretor-fundador do Piratas Mairiporã, grupo criado em 2015 por praticantes de canoagem e stand up paddle. Segundo Coelho, é possível observar dentre os colaboradores do mutirão pessoas da Capital, Franco da Rocha e de outras cidades, “mas não se ver vizinhos e colegas da cidade contribuindo com a atividade cidadã”.

Piratas Mairiporã

Para os atuais 25 integrantes do Piratas Mairiporã, o mutirão é uma realidade anterior a criação do próprio grupo. Sob a bandeira da “liberação da canoagem e stand up paddle com todos os equipamentos de segurança, colete salva-vidas e instruções necessárias”, lembrando que “não estão lutando para que as pessoas se joguem na água sem colete, sem nada”, a equipe, ainda sem autorização da Sabesp – concessionária responsável pelo abastecimento de água e saneamento de esgoto – para usar as águas da Paiva Castro para suas atividades, reivindica maior isonomia na liberação do reservatório para a realização de práticas desportivas.  
Foto: Reprodução / Facebook
“Não há em Mairiporã nenhum tipo de liberação, por escrito, que permita o uso da represa, isso em todos os seus trechos. Entretanto, o ‘Navega’, programa esportivo da prefeitura municipal e do governo do Estado, tem liberação para exercer suas atividades naquelas águas”, comenta Coelho, que reforça as semelhanças entre os projetos: “o ‘Navega’ envolve caiaque da mesma forma e o nosso grupo não pode desenvolver o mesmo tipo de prática na represa porque falam que não temos permissão. É no mínimo controverso, já que tem pessoas utilizando a água para os mesmos fins”.

Coelho diz ainda que os “piratas”, como são chamados os membros do grupo, defendem uma mudança na forma como se relacionam os moradores de Mairiporã e a Paiva Castro. “A população não tem a cultura de ir à represa, de usá-la para pescaria e piqueniques nas margens. Até porque ela parece ser um bicho papão da cidade, por causa das muitas histórias de pessoas que são encontradas mortas ou somem naquela região, além das lendas urbanas, como a de que existe uma sucuri gigante no fundo da represa. Ainda assim, se for para a prática de esportes, desde que com o colete salva-vidas, é um espaço ótimo”, expõe o diretor-fundador, lembrando que isso só seria possível com o apoio da Sabesp, deslocando, por exemplo, um bombeiro salva-vidas.

Navega SP

Segundo seu site oficial, o Navega SP é uma “ação social da Secretaria de Esporte, Lazer e Turismo que utiliza os esportes náuticos do remo, vela e canoagem como ferramenta de inclusão social para jovens com idade entre 12 e 15 anos estudantes da rede pública de ensino”.

Em Mairiporã, a prefeitura municipal abriu no último dia 19/3 as inscrições para o “Projeto Navega da Família Mairiporã”, com atividades para famílias e atletas de esportes náuticos do programa Navega SP. As aulas serão semanais, aos sábados, das 8h às 13h, a partir de 6/4.

Clique aqui para mais informações.

O espaço da coluna Mais SP está aberto para manifestação da coordenação do projeto em Mairiporã.

Caso do ambulante morto a socos e pontapés ao defender travestis na região central não cairá em esquecimento, assim como a luta agora é por esclarecimentos sobre o assassinato a facadas de um cabeleireiro gay na Av. Paulista

Atualizado em 26/12/2018, às 9:54.

No último dia 25 completou-se exatos dois anos do assassinato de Luiz Carlos Ruas, vendedor ambulante morto a socos e pontapés nas dependências da estação Pedro II do Metrô, na região central de São Paulo. Com então 54 anos, Ruas tinha o apelido de “Índio”, por conta dos traços e da tonalidade da pele, e morreu ao defender da violência gratuita de dois homens duas moradoras de rua travestis. À princípio, as garotas tinham chamado a atenção dos rapazes por estarem urinando em uma das paredes externas da estação. Em depoimento prestado em 2017, “Brasil” – apelido da travesti Raíssa, uma das vítimas – disse que chegou a ser coagida pelos homens sob a acusação de que teria furtado o aparelho celular de um deles.
Imagem: Jornalistas Livres
Ao longo de 20 anos, Índio esteve ali em frente a uma das entradas da estação vendendo bebidas, doces e salgadinhos. Ao pôr do sol daquele dia, ele arrumava os produtos de seu carrinho antes de seguir ao compromisso da noite: a ceia com a esposa Maria de Oliveira, com quem foi casado por mais de 30 anos. Ela ajudava no comércio e havia saído pouco antes das agressões para preparar o jantar – a situação financeira daquele mês não permitiu que tirassem folga no feriado de Natal.

Maria preparou o jantar e aguardou o esposo que não veio. Em seu lugar, a notícia de que seu companheiro havia sido espancado até a morte, numa briga covarde em que perdeu a vida em defesa da diversidade.

Na tevê, graças a imagens do circuito interno de segurança, Índio aparecia defendendo-se do ódio que lhe atingia na forma de socos e pontapés desferidos pelos primos Alípio Rogério dos Santos – 28 anos – e Ricardo Nascimento Martins – 22 anos. Caído sobre o piso da estação, Ruas morreu por não ter se omitido.
Arte: Grupo Gay da Bahia
Dois anos após o assassinato, no dia 15/12, o júri popular constituído para julgar os assassinos manteve a prisão dos primos, alterando apenas o tipo: de preventiva para 15 anos e três meses de reclusão em regime fechado por “homicídio qualificado por motivo torpe, meio cruel e recurso que dificultou a defesa da vítima”. A repercussão do caso talvez tenha, sim, colaborado com tal desfecho jurídico – considerado rápido para os parâmetros do lento sistema judicial brasileiro. Mas, no final das contas, trata-se de justiça que segue ritos pré-estabelecidos, permite-se investigar e apresenta conclusão – processo com condicionantes que nos distanciam do “olho por olho” e que, por infelicidade, têm perdido espaço no Brasil.

Apesar de a decisão do júri, que, sim, responde à altura o grito por justiça que permeava a morte de Luiz Carlos Ruas, o caso do Índio vai além do campo judicial. Ele é simbólico e deve ser lembrado por ter suscitado a reflexão, ainda que com muita crueldade, sobre a situação da comunidade LGBT no Brasil, país que mais mata pessoas desse grupo social no mundo. De acordo com a ONG Grupo Gay da Bahia, responsável por levantamentos anuais sobre violência contra homossexuais, até outubro 346 pessoas foram mortas por crime de ódio. O relatório mais detalhado com o número final de vítimas fatais deve ser publicado somente em 2019 e leva em consideração apenas crimes notificados, deixando de fora os subnotificados, aqueles em que a vítima não presta queixa, e os omitidos pelo Estado, que por vezes se nega a colaborar porque prevê críticas à falta de políticas públicas inclusivas.
Arte: Grupo Gay da Bahia
A permanecer tais dígitos, o número representa queda de aproximadamente 22,3% em relação a 2017, quando foram registrados 445 homicídios por LGBTFobia em todo o País, sendo que 12 das vítimas eram heterossexuais com ou sem vínculos com o chamado universo LGBT, como o caso de Ruas, que teve de sair em defesa de dois gays. Ainda segundo o Grupo Gay da Bahia, a cada 19 horas um LGBT é assassinado ou comete suicídio por homotransfobia.

Já a REDETRANS Brasil, instituição que também analisa e cruza informações sobre homicídios de integrantes do grupo social, 123 pessoas foram assassinadas até outubro – 125 pessoas haviam sido mortas até setembro de 2017.

O Estado, na figura do Ministério dos Direitos Humanos, também reforça a percepção de que os crimes contra pessoas LGBT registrados têm diminuído, ao menos quanto às denúncias formais por meio do “Disque 100” – serviço telefônico gratuito para vítimas de violações de Direitos Humanos. De acordo com o órgão, 560 denúncias foram registradas no 1º semestre deste ano contra 1720 protocoladas em todo o ano passado.

Os dados oficiais, inclusive de entidades não governamentais, parecem mostrar queda no número de casos, sobretudo de mortes, motivados por homofobia. No entanto, a falta de políticas públicas de inclusão e a chegada ao Poder de um grupo político fundamentalista e conservador devem impedir grandes avanços no combate afirmativo ao ódio impetrado em ideias retrógradas que se colocam contra a diversidade e o mundo moderno.
Foto: Reprodução / Folha de S. Paulo
No jogo do tempo os fatos ocorrem e a realidade grita. Naquele mesmo 25 de dezembro completou-se quatro dias da morte do cabeleireiro homossexual Plínio Henrique de Almeida Lima. Ao lado de seu marido e de outro casal gay, o rapaz de 30 anos voltava do Parque Ibirapuera pela Av. Brigadeiro Luís Antônio quando, no cruzamento com a Av. Paulista, dois homens incomodados com o grupo de homossexuais e por que estavam de mãos dadas começaram a gritar xingamentos e ofensas. Segundo consta do boletim de ocorrência, um dos colegas de Plínio teria partido para vias de fato com um dos homens, que, agredido, pegou uma faca e desferiu ataques ao peito do cabeleireiro, que chegou a ser encaminhado à emergência do Hospital das Clínicas, mas não resistiu aos ferimentos. Plínio parece ter perdido a vida na mesma batalha que vitimou Luiz Carlos Ruas há dois anos.

Que o Natal, produto nobre do mundo publicitário, possa um dia ser mais justo e verdadeiramente feliz. Enquanto “Luizes”, “Plínios” e tantos outros tiverem de perder suas vidas em atos que, com muito custo, resistem ao silêncio e esquecimento da opinião pública, sentimentos como indignação, revolta e infelicidade são naturais.

Não é errado sentir-se infeliz quando as coisas não estão bem. É um erro e tolice comemorar sem ter o que comemorar.

Feliz Natal!

ATUALIZAÇÃO: O portal UOL informou, na manhã de quarta-feira 26, que a Polícia Militar do estado de São Paulo prendeu Fúvio Rodrigues de Matos, homem identificado por câmeras de segurança como responsável pelo ataque com um canivete à Plínio Henrique de Almeida Lima. Em depoimento obtido pelo site, Fúvio diz que,"em certo momento, começou a chover e eu falei para o meu colega: 'corra que nem homem'. Nesse momento, uns quatro rapazes passavam por mim e um deles, esse com o qual eu briguei logo depois, me disse: 'você está falando comigo?'". Matos afirmou ainda ter se arrependido do que fez. "Eu falei: 'vai embora, que eu não quero confusão'. Então, eu estava apavorado, desci a escada e fui embora. Eu quero dizer que sou trabalhador e não queria confusão. E estou muito arrependido pelo que aconteceu", declarou.


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